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Juninho Pernambucano

Por Elcio Ramalho

Reportagem publicada em 10/03/2005 Última atualização 21/03/2005 16:55 TU

Juninho : « eu virei um lyonês »(Foto : Elcio Ramalho/RFI)

Juninho : « eu virei um lyonês »
(Foto : Elcio Ramalho/RFI)

Tri-campeão francês Juninho Pernambucano sonha com a Liga dos Campeões e o Mundial da Alemanha.

O frio glacial da manhã de domingo e a neve que quase faz esquecer que Tola Vologe é um centro de treinamento de futebol não conseguiram desencorajar dezenas de torcedores fanáticos a acompanhar um breve treino físico do Olympique de Lyon . Alguns minutos de corrida, outra meia hora de exercícios e o pernambucano Juninho , coberto de toca e luvas, corre em direção ao vestiário. De passagem , abaixa no gramado todo coberto de gelo, faz um bolinho com as mãos e ameaça jogar num pequeno grupo de torcedores em cadeiras de roda. A brincadeira termina em risos, fotografias e um reforço na imagem de ídolo sensível ao assédio dos fãs.

Treino do Olympique de Lyon em dia de neve
(Foto : Elcio Ramalho/RFI)

«Juninho é o emblema ;  além de grande jogador ele é brincalhão e extremamente gentil. Todo mundo aqui o adora e ninguém ousa criticá-lo», afirma Angelique Leville, de 14 anos, exibindo duas  fotos do craque. Do outro lado do alambrado , um grupo de adolescentes aponta outras qualidades do brasileiro, dentro de campo: «Nunca vou esquecer uma cobrança de falta de 32 metros quando a bola foi no ângulo», lembra um deles. «Além de um cobrador de faltas magnífico ele melhorou muito os passes e ajuda mais a defesa», acrescenta outro atento torcedor.

Juninho desembarcou na primavera de 2001 em Lyon com sede de títulos mas sem apostar na sua vocação de ídolo e muito menos de artilheiro . Tri-campeão francês , 28 gols ... em três anos, o meia-direita engrenou uma revolução na sua carreira, imagem e sonhos.

Perseguido pelas câmeras de televisão e microfones de repórteres a cada partida de seu time no campeonato francês ou pela Liga dos Campeões , Juninho lembra, com certa nostalgia, a chegada discreta num clube até então pouco conhecido dos brasileiros . «No Brasil , só se falava de Paris Saint–Germain e Olympique de Marselha. Lyon ? Ninguém comentava», conta Juninho Pernambucano, lembrando que na época o foco da mídia estava voltado para o PSG e seu recém-contratado craque Ronaldinho Gaúcho.

Sem o carimbo da fama e incapaz de dizer uma palavra em francês, Juninho não era alvo de caçadores de autógrafos nem de perguntas de jornalistas. Mas a integração dentro e fora de campo foi rápida e calorosa, garantida pela presença da pequena comunidade brasileira que se instalou para marcar a história do Lyon. Com 5 gols logo na primeira temporada , Juninho Pernambucano, ao lado de Edmílson na defesa, Caçapa no meio campo e Sonny Anderson no ataque, levantou a primeira taça do Olympique de Lyon como campeão francês.

«Nunca quis ser nem me considero artilheiro. É uma surpresa fazer tantos gols»

Qual o segredo da cobrança de faltas ?
(Foto : Elcio Ramalho/RFI)
Os treze gols marcados com a camisa 8 do Lyon entre 2002/2003 e os outros 10 na temporada seguinte moldaram o status de ídolo e abriram as portas do panteão reservado aos maiores batedores de falta do futebol.

A cobrança de Juninho que selou a goleada de 3 a zero do Lyon sobre o time alemão Werder Bremen em fevereiro pela Liga dos Campeões , fez Michel Platini, um dos maiores nomes da história do futebol mundial, afirmar diante das câmeras de tevê da França: «Poucos jogadores do mundo têm o talento que ele demonstrou.»

A habilidade com o chute de bola parada vem do início de sua carreira no Sport de Recife, quando treinava cobranças após os treinos. Nos 6 anos passados no Vasco da Gama , sofria com a concorrência de Romário e outros batedores mas foi com a camisa cruzmaltina que fez o gol de falta guardado com mais carinho na memória . O chute certeiro no empate em Buenos Aires com o River Plate levou o Vasco à final e depois à conquista da Copa Libertadores em 1998 , ano do centenário do clube.

Com a camisa do Olympique , Juninho ocupou um espaço vazio e, como titular absoluto e eficiente das cobranças de falta , agregou o raro privilégio de fazer o estádio Gerland de Lyon se inflar de esperança e os locutores prepararem a garganta a cada apito do árbitro para um tiro direto. Fã dos ex-craques Zico e Gerson , ele se esmera na falta também por achá-la um dos gestos mais elegantes do esporte mais popular do planeta. A parte uma certa aptidão natural, ele defende a persistência e obstinação dos treinamentos como trunfo de suas cobranças capazes  - a distâncias superiores a 30 metros  - de encaixar a bola no ângulo, como um pintor que dá o toque de arte a sua obra.

«Nunca quis e não me considero um artilheiro. É uma surpresa fazer tantos gols aqui» faz questão de repetir Juninho, surpreso por superar a quantidade marcada nos gramados brasileiros. Independente das cobranças de falta que correspondem a cerca de 36 por cento dos seus gols marcados , acredita que já tem reservado seu lugar na história do clube com a conquista do inédito tri-campeonato francês.

A tripla faixa no peito consolidou sua condição de líder da equipe e símbolo de um esquema tático que privilegia o conjunto e não a exploração do talento individual. Para o companheiro Sidney Gouvou , «Juni» , como é chamado pelo elenco,  é o jogador capaz de decidir uma partida, seja de bola parada ou com um lance genial. «E' ele quem resolve todas as situações», conclui. Para o ex-cruzeirense Cris, contratado pelo Lyon nesta temporada, além de líder, Juninho contribui para a adaptação dos brasileiros que chegam ao clube.

O papel de «embaixador da bola» inclui organizar jantares e encontros entre as famílias de Caçapa , Cris e o mais jovem desta comunidade brasileira, o recém-chegado Nilmar, revelado pelo Internacional de Porto Alegre. «Encontramo-nos com frequência mas sem exagero. Já nos vemos todos os dias aqui no clube, se estender demais à vida privada pode gerar stress», diz diplomaticamente.

A Alemanha está pertíssimo

O brasileiro conquistou a torcida de Lyon
(Foto : Elcio Ramalho/RFI)
Aos 30 anos, completados em 30 de janeiro , Antonio Augusto Ribeiro Reis Jr, saboreia o sucesso como fruto de  muita disciplina profissional. Filho caçula de uma família de cinco irmãos, Juninho seguiu o instinto revelado  nas quadras de futebol de salão de Recife.   Depois de 1 ano e meio no Sport, onde se sagrou campeão pernambucano, chegou à grande vitrine do futebol brasileiro vestindo a camisa do Vasco da Gama, clube que entre 1995 e 2000 preencheu seu currículo com os títulos de  campeão da Copa Libertadores, duas vezes campeão brasileiro , um título estadual e uma Copa Mercosul.

Superada a separação com o clube carioca, onde obteve na justiça ruptura de contrato, as portas do tão sonhado futebol europeu poderiam ser abertas pelo Barcelona da Espanha mas achou a transferência para o futebol francês um negócio mais seguro.

Olhando em perspectiva , foi um acerto e tanto . Juninho garante que a fama e o dinheiro adquiridos nesses quase 4 anos na França não alteraram o estilo simples e sua maneira de ser, caseiro e avesso a badalações. Comenta com orgulho que a filha Giovana de 6 anos já fala fluentemente o francês e a mais nova, Maria Clara, é nascida em Lyon. O apreço pela gastronomia e o hábito de tomar vinho durante as refeições caracterizam , segundo ele, uma adaptação à sociedade francesa embora não deixe afrouxar os laços com a sua cidade natal.

«Posso dizer que sou um brasileiro lionês», resume o melhor jogador estrangeiro de 2004 na França segundo a revista especializada France Football. A ponte Recife - Lyon tem boas perspectivas de continuar ativa por mais alguns anos. O contrato dele com o clube termina em junho de 2006 mas as negociações caminham na direção de uma renovação  para mais três anos. Juninho não vê problema nenhum em fazer carreira em apenas um clube na Europa. Conquistar o quarto título consecutivo de campeão francês é o objetivo imediato mas uma conquista da Liga dos Campeões não parece mais um sonho tão distante assim.

Com a camisa do Lyon , Juninho não  apenas acrescentou títulos a sua coleção pessoal , voltou a ser convocado com regularidade para a seleção brasileira e briga para ser titular do time de Carlos Alberto Parreira. Depois de  perder a Copa do Japão e da Coréia, Juninho não quer deixar passar a oportunidade de disputar o Mundial de 2006.  «Terminar uma carreira como a minha, cheia de títulos mas sem disputar uma Copa do Mundo seria frustrante» admite o jogador. Afinal, vista  assim de Lyon , a Alemanha está pertíssimo.