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O Brasil no Mundo

Os brasileiros da França

Por Pamela Valente

Reportagem publicada em 07/07/2005 Última atualização 07/07/2005 20:25 TU

Dos brasileiros que participam da lavagem das escadarias da basílica do Sacré-Cœur, na colina de Montmartre, em Paris, a maior parte nunca lavou a Igreja do Senhor do Bonfim, em Salvador. Mas isso não impede um grande entusiasmo. Porque viver no exterior tem dessas coisas : a gente desenvolve um saudosismo até do que não viveu mas tem gostinho nacional…

Uma vez por ano, os brasileiros reconstituem a festa da lavagem do Bonfim nas escadarias da basílica do Sacré-Coeur, em Paris.
Foto: Association Fafadiese
A comunidade brasileira na França mudou muito nos últimos anos, se diversificou, mas em alguns (poucos) eventos, como a lavagem do Sacré-Cœur ou concertos de grandes nomes da música brasileira, todo mundo se reconhece. Durante muito tempo, os brasileiros de Paris tinham uma reputação –de algum modo bem fundada—de elite intelectual. A França se orgulhou de receber estudantes refugiados da ditadura militar, e mais tarde pesquisadores, atraídos pelas prestigiosas universidades francesas. Esses brasileiros continuam a chegar à Paris e outras cidades famosas por seus centros universitários. Mas eles talvez não sejam mais a maioria da comunidade. Desde 1996, o fluxo de imigrantes brasileiros aumentou, devido ao fim da necessidade de um visto de entrada. Essa facilidade abriu a porta para um outro tipo de imigrante brasileiro, menos interessado na cultura francesa, mais preocupado com problemas econômicos. « Só que não tem trabalho por aqui », comenta Celso Libânio, do Serviço Consular da Embaixada do Brasil em Paris. « Eu imagino que no Brasil as pessoas que pensam em vir à França desconhecem a realidade do país ». Celso se refere a uma taxa de desemprego de 10 por cento da população e uma política de imigração bem restritiva. É praticamente impossível saber com certeza quantos brasileiros vivem hoje na França. Nem todo mundo se inscreve no Serviço Consular, a começar pelos clandestinos… Mas Celso Libânio estima que hoje entre 25 e 30 mil brasileiros vivem na França, 10 por cento deles como imigrantes em situação ilegal.

Em Marselha, comprar farinha é ocasião para falar português


Sandra Vincenti trocou Natal por Marselha e criou um ponto de encontro para os brasileiros da cidade.
Foto de Pamela Valente

 Os «visíveis» continuam a ser em sua maioria estudantes inscritos em universidades francesas. Você vai encontrá-los em boa parte das manifestações culturais brasileiras. A Jangada é uma associação que organiza eventos brasileiros em Paris. A associação é responsável pelo primeiro Festival de Cinema brasileiro na capital francesa, organizado há 7 anos no mês de abril. Juliette Vincent, uma jovem francesa que trabalha na Jangada e fala um português perfeito, conta que os estudantes brasileiros sempre marcam presença nos eventos culturais com artistas brasileiros. Ao mesmo tempo, Juliette chama a atenção para outra característica da comunidade : esse tipo de evento é o único lugar onde você pode encontrar muitos brasileiros juntos. A comunidade não tem bares ou restaurantes onde todo mundo se reúne numa sexta-feira à noite, por exemplo. «Os pontos de encontro brasileiros em Paris são frequentados por franceses que adoram o Brasil», ri Juliette. Mas a francesinha tem também uma explicação para isso : esses estudantes escolheram morar na França, portanto eles se esforçam para se integrar na sociedade francesa, ter amigos franceses e viver de perto a realidade francesa. Fazem parte dos « visíveis » também brasileiros de uma outra categoria : os cônjuges de franceses. Os casais mistos são comuns, vivendo pelos quatro cantos da França, e sempre mantendo um contato estreito com o Brasil. Um exemplo é Sandra Vincenti, que trocou Natal por Marselha, no sul do país, par amour por Laurent. Juntos eles abriram a Maison du Brésil, que é uma associação e uma loja de produtos brasileiros. A Maison du Brésil se tornou o grande ponto de encontro dos brasileiros que vivem no sul da França. Longe da capital, eles têm menos oportunidade de participar de eventos brasileiros, têm menos informações sobre o Brasil e se sentem um pouco mais abandonados desde o fechamento do Serviço Consular de Marselha, em 1998. «Nos fins de semana, vir comprar charque ou farinha de mandioca é a ocasião, para muita gente da região, de falar português e trocar figurinhas sobre o Brasil», explica Sandra. Mas existem também os brasileiros «invisíveis», cada vez mais numerosos na opinião de Celso Libânio, do Serviço Consular.


Os invisiveis não resistem mais que três invernos


«A França muitas vezes é país de passagem para essas pessoas. É a porta de entrada européia para quem pretende ir trabalhar na Inglaterra ou na Espanha. Mas como os controles de fronteira estão mais severos nesses países, as pessoas acabam voltando para cá», explica Celso. E o que eles fazem por aqui ? Difícil dizer com certeza. Se até algum tempo atrás era comum encontrar músicos brasileiros que ficavam um tempo na França mesmo sem a papelada legal, hoje o perfil dos ilegais mudou. Celso conta dramas clássicos de ilegais : uma senhora que trabalhava como faxineira ficou sem receber salário alguns meses, foi se queixar ao patrão e ele a colocou na rua. Se ela fosse à polícia, o patrão provavelmente seria processado por trabalho escravo, mas ela seria expulsa da França e não receberia nenhuma indenização. Celso tem a impressão de que há uma «rede» de faxineiras brasileiras que vêm trabalhar na França mesmo sem documentos. Para os homens, ainda segundo Celso, parece haver uma facilidade de trabalho na construção civil; pela facilidade da língua, brasileiros ilegais são empregados por pedreiros portugueses. Todos correm os mesmos riscos… Mas Celso Libânio acredita também que essas pessoas não ficam muito tempo. «Elas não se instalam. É muito difícil suportar mais do que 2 ou 3 invernos franceses estando em situação precária», ele comenta. O que sobressai é então uma comunidade fragmentada, que não se conhece, não se encontra, e que cada vez mais reflete as mesmas desigualdades sociais encontradas no Brasil.



http://www.bresil.org/
http://www.jangada.org/
http://www.aobrasil.com/

Celso Libânio

Do serviço consular da Embaixada do Brasil, em Paris

A globalização se reflete também na vinda de pessoas que não tendo emprego que lhes permita ter uma vida de classe média - e devido às informações pela televisão, rádio, jornais, de como se vive no exterior - são atraídas pela França e outros países da Europa.

07/07/2005 Por Pamela Valente

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