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A juventude preferia as obras dos pensadores de esquerda sem afinidades com a ficção

Reportagem publicada em 13/05/2008 Última atualização 16/05/2008 17:39 TU

Herbert Marcuse, o guru da geração de 68.  Foto: marcuse.org

Herbert Marcuse, o guru da geração de 68.
Foto: marcuse.org


Nas universidades, nas conversas, nos protestos de rua em Maio de 1968 o objetivo era dizer coisas que nunca tinham sido ditas antes mas que já estavam nos subconscientes. O mesmo aconteceu na literatura da época que, segundo o escritor peruano Alfredo Brice Echenique, autor de A vida exagerada de Martin Romaña, refletia até então o clima de tédio do período pré-68.

Quando as barricadas bloquearam as ruas do Quartier Latin em Paris, quando os jovens rebelados decidiram decretar o estado de felicidade permanente, os livros que mais venderam não foram os romances de ficção. Os autores da moda eram o alemão Herbert Marcuse, o filósofo francês Louis Althusser, o chinês Mao Tse Tung, o guerrilheiro Che Guevara. As ideologias, geralmente radicais, abriam caminho para a liberdade de expressão e para uma verdadeira insurreição das palavras.

Daniel Cohn-Bendit, hoje, é deputado europeu do Partido Verde.   Foto: AFP

Daniel Cohn-Bendit, hoje, é deputado europeu do Partido Verde.
Foto: AFP

A geração que assistiu essa explosão contra a sociedade estabelecida, seja na França seja no resto do mundo, só foi transformar suas experiências em literatura de ficção alguns anos depois. O romancista francês Bertrand Poirot-Delpech, publicou Os grandes desse mundo, em 1976, inspirado em um mistério histórico: o desaparecimento do general Charles De Gaulle durante 24 horas, no dia 29 de maio de 1968. Na realidade, o presidente francês foi a Baden Baden, na Alemanha, para encontrar conselheiros, o que alimentou boatos de uma eventual renúncia. Na imaginação de Poirot-Delpech, De Gaulle sumiu para poder conversar com um policial. O encontro foi numa estação de metrô, em forma de pique-nique.

Zuenir Ventura anuncia a “ressaca que vinha com o AI-5”, em seu livro “1968, o ano que não terminou”.  Foto: Clube de Engenharia

Zuenir Ventura anuncia a “ressaca que vinha com o AI-5”, em seu livro “1968, o ano que não terminou”.
Foto: Clube de Engenharia

Esse exemplo, entre tantos outros, teve efeitos semelhantes no Brasil. O jornalista Zuenir Ventura, que estava em Paris em maio de 1968, transcreveu os mesmos sentimentos em um clima político diferente. Seu livro 1968, o ano que não terminou revive personagens que condensam o comportamento da época no Brasil, marcado pelo 13 de dezembro, dia da aprovação do AI-5. Daí para frente, diz Zuenir, desceu o “manto das trevas”. E ele acrescenta: “o movimento francês começou com uma reivindicação sexual, uma reivindicação de dormitórios mistos. Aqui (no Brasil), começou com o assassinato de um estudante”.

O líder indiscutível dos protestos de 68 na França, Daniel Cohn-Bendit, que acaba de publicar o livro Forget 68 (Esqueça 68), cujo título define bem o conteúdo, admite hoje que o sentimento antiautoritário de 40 anos atrás, que para ele parecia limitado ao Quartier Latin, era na verdade planetário.

(Reportagem realizada por Adriana Brandão)


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Zuenir Ventura

Jornalista e escritor

“O ano de 68 deixou o que chamo de herança maldita que são as drogas, aquele mito ingênuo, aquela utopia inocente de que as drogas eram um instrumento de expansão da consciência, de abertura da percepção. Tudo isso veio dar em quê ? Veio dar realmente nas multinacionais do narcotráfico. Mas ao lado desse legado negativo, há grandes conquistas no plano das liberdades individuais. Temos quatro movimentos muito importantes: o movimento feminino, o movimento negro, o movimento gay – um dos que mais avançaram – e o movimento ecológico”.