Busca

/ languages

Choisir langue
 

Política Internacional

A integridade territorial está em jogo

Reportagem publicada em 16/09/2008 Última atualização 16/09/2008 19:10 TU

Em junho passado, autonomistas da região de Tarija, na Bolívia, comemoraram a vitória no referendo.  Foto: Reuters

Em junho passado, autonomistas da região de Tarija, na Bolívia, comemoraram a vitória no referendo.
Foto: Reuters


Não é nada comum uma reunião de todos os governos sul-americanos para discutir os problemas internos de um dos Estados membros (neste caso a Bolívia). Afinal de contas, a grande tradição da região continua sendo a não-intervenção nos assuntos internos dos vizinhos. Tradição aliás reiterada veementemente há poucos meses atrás para condenar a ação militar da Colômbia no Equador e as ingerências chavistas na guerra interna colombiana. Se a reunião da Unasul (União das Nações Sul-americanas) foi possível é que todos os Estados da região estão cada vez mais preocupados com o perigo de desintegração da Bolívia.

A questão não é só as consequências catastróficas para a estabilidade da região se o Estado que se encontra no coração da América do Sul afundasse no caos. O principal motivo de inquietação hoje, é a possibilidade de uma secessão das províncias bolivianas do leste, a Meia-Lua, que poderia criar mais um precedente perigosíssimo para a integridade territorial dos Estados nacionais, não só na região, mas também no resto do mundo.

A independência do Kosovo, apesar de ter sido a única solução viável, foi tão mal administrada que abriu uma caixa de Pandora, da qual a segunda praga que escapou foi a Ossétia do Sul e a Abkázia invadida pelos russos e agora em processo simples de anexação pela Federação russa. Estes acontecimentos traumáticos estão reforçando as vocações autonomistas em várias partes do mundo. O governo autônomo do País Basco, na Espanha, está apelando frente à Corte de Direitos Humanos da Europa, contra uma decisão da Corte Constitucional espanhola de proibir um referendo sobre a independência basca. A Bélgica está pertinho de uma implosão com valões e flamengos indo cada um para o seu canto, criando dois mini-Estados independentes. Na Escócia, o movimento independentista continua forte, assim como ele existe também na Itália com a Liga do Norte. E tudo isto só para falar da Europa. Na África ou na Ásia, existem dezenas de Estados multiétnicos onde minorias internas aspiram a sair do controle do Estado central.

É claro que esta tendência às autonomias ou até às independências regionais não vem só dos apetites de grandes potências para conquistar territórios, como no caso da aventura russa na Geórgia. Vem também da perda de poder real dos Estados nacionais frente à globalização. Os governos dos Estados nacionais têm cada vez menos poder e influência sobre os grandes fluxos econômicos financeiros ou culturais transnacionais. Cada região interna, sobretudo as mais ricas ou as mais reprimidas e exploradas estão começando a pensar que é melhor arriscar serem pequenas e independentes do que simplesmente fazer parte de um Estado impotente ou opressor. É no entanto todo o sistema internacional, baseado num mundo de interação entre Estados soberanos com integridade territorial garantida, que está em jogo. Sem falar no jogo de grandes potências mundiais ou regionais que podem tentar aproveitar esta situação para avançar os próprios interesses.

No caso da América Latina ou da América do Sul, existem bastante problemas fronteiriços ou com populações indígenas, para dar calafrios em todos os dirigentes da região. Daí também a irresponsabilidade de líderes como Chavez ou Ortega da Nicarágua, quando apoiaram oficialmente a anexação russa da Ossétia e da Abkázia. Mais tiro no pé do que isso é impossível. O problema é que o caso boliviano não é nada fácil de revolver. Até agora, a América do Sul em peso apoiou o governo central de La Paz e condenou claramente qualquer veleidade de independência por parte das províncias orientais. Mas, ao mesmo tempo, todos estão pedindo para que Evo Morales negocie de boa fé com a oposição. Pelo visto, por enquanto, Morales acha que tem cacife para impor a sua vontade à força e só propõe negociacões com os representates da Meia-Lua para ganhar tempo, sem nenhuma vontade de chegar a um acordo. Só que este tipo de teatrinho é extremamente perigoso. Morales não tem condição de impor a sua vontade ao país inteiro sem provocar um enfrentamento que pode levar a uma tentativa de secessão.

Vamos ver se, finalmente, os sul-americanos vão ter a coragem de impor uma mediação na crise boliviana. Mediação esta que passa por cima do dogma da não-intervenção em nome da defesa da integridade territorial e da soberania de um Estado membro. Parece e é bastante contraditório, mas o mundo à beira de uma paz fria com a Rússia, está se tornando infinitamente mais complicado.

(Crônica de Alfredo Valladão, do Instituto de Estudos Políticos, de Paris)

 

Crônicas

Análise/Chile

O presidente eleito do Chile, Sebastián Piñera, em discurso de vitória no dia 17 de janeiro de 2010.Foto: Reuters

Para analista, alternância é melhor que caudilho eterno

19/01/2010 13:30 TU

Política internacional

Costa do Sauipe.Foto: Flickr

Cúpulas latino-americanas demais

Excesso de encontros esconde falta de liderança, na opinião de Alfredo Valladão, cronista de política internacional da RFI

16/06/2009 09:30 TU

Política Internacional

  Foto: Reuters

G20 foi fiel ao liberalismo

«Ninguém sabe qual o bom mix de controle e liberdade dos mercados», escreve o cronista Alfredo Valladão

05/12/2008 18:01 TU

Política Internacional

Internet é a nova arma do poder

O cronista Alfredo Valladão analisa as astúcias midiáticas da campanha de Barack Obama

11/11/2008 17:09 TU

Política Internacional

As principais vítimas da crise ?

Os países que exportam matérias-primas e a idéia do desenvolvimento sustentável, responde Alfredo Valladão

22/10/2008 19:41 TU

Política Internacional

  Foto: Reuters

Herança política de Mandela ameaçada

Na África do Sul, a frente partidária ANC resvala para o clientelismo, escreve o cronista Alfredo Valladão após demissão do presidente Mbeki

24/09/2008 17:06 TU

Política Internacional

Para o cronista Alfredo Valladão, as manobras navais russo-venezuelanas importam a guerra fria.  Foto: Reuters

No Caribe a supremacia ainda é americana

Para o cronista Alfredo Valladão, as manobras navais russo-venezuelanas importam a guerra fria

09/09/2008 17:23 TU

Política Internacional

  Foto: FAO

Energia: único tema na agenda do planeta

Alfredo Valladão escreve sobre as oportunidades para o Brasil

03/09/2008 18:43 TU

Política Internacional

«Ser súdito de Moscou nunca foi natural»

O cronista Alfredo Valladão dá sua versão dos conflitos no Cáucaso

29/08/2008 15:07 TU