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Reportagem publicada em 24/09/2008 Última atualização 24/09/2008 17:07 TU
Em frente ao Parlamento, na Cidade do Cabo, manifestantes de diferentes partidos foram defender Thabo Mbeki.
Foto: Reuters
Oficialmente, Thabo Mbeki foi acusado de pressionar a Justiça para que ela condenasse o seu rival, Jacob Zuma, que tomou conta da ANC e que será provavelmente o próximo presidente do país depois das eleições em 2009. Zuma não tem lá uma reputação das melhores, acusado de corrupção e até de ter violentado uma menina com AIDS. Antigo número dois de Mbeki, Zuma foi afastado e saboreia a sua vingança contra o antigo chefe.
Essa commedia dell' arte entre os dois pesos pesados da política sul-africana tinha coisas mais sérias em pano de fundo. Desde que Nelson Mandela deixou a presidência, a ANC vive numa briga interna entre uma ala moderada, favorável à economia de mercado e a um capitalismo liberal, e a ala esquerda liderada pelo partido comunista e os sindicalistas da COSATU. Thabo Mbeki, apesar de ter sido comunista, adotou uma política econômica ortodoxa, abrindo os mercados, encorajando os investimentos estrangeiros e privatizando empresas públicas. Uma política bem sucedida do ponto vista do crescimento econômico, já que a África do Sul vem crescendo a uma taxa de 5% ao ano.
Mas a esquerda da ANC denuncia a falta de resultados sociais, sobretudo com o aumento explosivo do desemprego que foi um dos fatores que levaram à recente violência de massa contra os imigrantes do Zimbábue. Jacob Zuma, com um discurso populista, conseguiu explorar este descontentamento da ala esquerda para tomar conta do partido. Mas isto não quer dizer que irá mudar o modelo econômico do país quando chegar à presidência. Na verdade, é provável que mantenha tudo na mesma, só botando os próprios cupinchas no lugar dos antigos.
A África do Sul está cada vez mais parecida com a Argentina : um partido hegemônico que aconchega esquerda e direita, e que toma conta do Estado e resvala cada vez mais para o clientelismo puro e simples pautado pelas brigas pessoais dos chefões. A estratégia política tem a ver cada vez menos com programas e propostas e cada vez mais com o fisiologismo. Manter-se no poder vira o único objetivo. A ANC não é de fato um partido, mas uma frente de partidos que se uniram na luta de libertação contra o apartheid. Só que hoje a ANC não é mais oposição, é governo. E governo tem que administrar o país, tomar decisões que ferem interesses ou dão vantagens para alguns. Não é mais possível manter a unidade em nome da luta contra o inimigo racista comum, pela simples razão que este inimigo já não existe como ameaça real e que o poder é a própria ANC. Quanto mais o Congresso Nacional Africano mantiver a ficção de um partido unido e coerente, mais ele vai cair no clientelismo e no populismo barato, ameaçando a herança de Mandela e as conquistas econômicas de uma África do Sul que se transformou na maior potência do continente negro.
Como na Argentina, com o partido peronista, o que poderia acontecer de melhor para o país seria a implosão da ANC em partidos mais coerentes : uma verdadeira esquerda, um verdadeiro centro liberal, uma verdadeira direita. Esta é a condição sine qua non para escapar do destino de república bananeira, para sair do atoleiro do fisiologismo, com as suas gangorras econômicas e sociais, e para manter e aprimorar a democracia na África do Sul. O apartheid já era. Agora, o desafio é construir um grande país. Mas pelo visto os principais líderes da ANC não estão nem aí para isto.
(Crônica de Alfredo Valladão, do Instituto de Estudos Políticos, de Paris)
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